Pela extrema valorização da figura ou da autoridade de pastores, numa cultura como a nossa, vai se esvaziando o cuidado e a responsabilidade de um para com outro no rebanho.
Uma parte do rebanho continua desejando esse
cuidado pessoal e acolhedor dos pastores e da liderança, enquanto que gente com
boa quilometragem, rodada nas igrejas, não acredita nisso e vive uma
insatisfação contínua.
Comunidades
cristãs vão se formando com novas caras e facetas no Brasil, em todas as
classes sociais. Casas, escolas, hotéis, clubes e ginásios tornam-se caminhos
diversos, mais interessantes e pertinentes dependendo da realidade urbana para
sua instalação. Pensar em ajuntamento de cristãos nos templos com projetos
arquitetônicos tradicionais ou contemporâneos, com médios e grandes espaços
cada vez mais difíceis e raros, e com toda sua complexidade legal, financeira e
estrutural, vai se tornando um projeto menos desejável e viável para muitas
igrejas e grupos eclesiásticos.
Em
cima dessa realidade desafiadora e pouco encorajadora, o pastoreio é ainda um
caminho mais complexo, no qual, muitas vezes, a expectativa pela ação pastoral
diante das necessidades das pessoas em dor, sofrimento e outros diversos
clamores vai dando lugar a sentimentos e percepções extremas: uma parte do
rebanho continua desejando esse cuidado pessoal e acolhedor dos pastores e da
liderança, enquanto que gente com boa quilometragem, rodada nas
igrejas, já “jogou a toalha” e não acredita mais ser possível esse pastoreio,
vivendo uma insatisfação contínua. Alguns buscam caminhos de sobrevivência em
movimentos localizados e nas redes sociais; outros simplesmente desistem e se
afastam dos ajuntamentos.
Pela
extrema valorização da figura ou da autoridade de pastores, numa cultura como a
nossa – na qual os grandes líderes são incensados e onde se cria e nutre uma
relação de extrema e inapropriada dependência –, vai se esvaziando o cuidado e
a responsabilidade de um para com outro no rebanho. Desvalorizam-se os membros
do corpo de Cristo, com seus dons e funções, e o senso de responsabilidade de
cada irmão em oração, acolhimento, compartilhamento, conselho mútuo, exortação,
visitação, serviço e fortalecimento de amizades espirituais. Jogar a
responsabilidade do cuidado pastoral somente sobre uma pessoa ou uma reduzida
liderança é, no mínimo, irreal, imprudente e imaturo, seja em grandes
ajuntamentos ou não. Claro, não se pode minimizar a importância daqueles que
receberam dons específicos para serem pastores e mestres, presbíteros e
diáconos, conforme a recomendação bíblica. Mas tal esvaziamento reflete, em
primeiro lugar, o descuido de muitos irmãos no cultivo de uma espiritualidade
saudável. Eles abriram mão da oração e da meditação na Palavra, da comunhão com
Deus Pai, Filho e Espírito Santo em primeiro lugar. A desvalorização da
intimidade e do alimento da fé, e da uma dependência maior de Deus, foi
deixando lacunas significativas.
Em
segundo lugar, a supervalorização de pessoas, e a dependência exagerada delas,
acabou trazendo como consequência a superficialidade Uma vida superficial, sem
características de profundidade e maturidade, e destituída de uma visão
encorajadora da fé cristã e da missão que nos foi confiada por Jesus Cristo é o
resultado disso. Acabamos nutrindo uma visão egoísta e antropocêntrica, quase
sempre ignorando o próximo a quem temos de servir e ajudar com o que somos e
possuímos. Membros de ajuntamentos vão se tornando mais exigentes, achando que
as igrejas precisam saciar suas necessidades nem sempre legítimas diante da
proposta bíblica da natureza e missão da Igreja. Então, o mercado da fé percebe
a lacuna e acaba se instalando para compensar aquilo que nós não encontramos no
pastoreio ou na ação pastoral cuidadosa.
Seja
com que formato for e onde se instalarem, os ajuntamentos cristãos não podem
abdicar da verdade do Evangelho, da mensagem das boas novas e de todo o
conselho de Deus que é a sua Palavra. Ora no meio de desertos e provas, ora em
pastos verdejantes e águas tranquilas, ovelhas precisam, em primeiro lugar,
depender mais do pastor Jesus e buscar crescimento nesta relação de dependência
e mentoria; em outras palavras, depender mais de Deus do que de homens, sem
desmerecer o valor do corpo de Cristo e das pessoas e líderes que o Senhor tem
colocado em seu caminho. Tudo isso para sermos melhores testemunhas, melhores
servos, melhores cristãos, vivendo a experiência comunitária de forma
consciente e responsável e que não nos deixe perder o compromisso e a vivência
da missão cristã – e, muito menos, nossa responsabilidade de anunciar e
sinalizar o Reino.
Retirado do site: http://cristianismohoje.com.br/