quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Por Que Devemos Ser Explicitamente Teológicos

Se não me engano, nossa igreja tem uma reputação de ser bastante teológica. Sei que por isso muitas pessoas têm vindo à nossa igreja. E imagino por que algumas pessoas têm saído dela, ou nem sequer nos procuraram. Mas nenhuma igreja deveria se desculpar por falar e gostar de teologia. Contudo – isto é uma importante advertência – se somos arrogantes com a nossa teologia, se a nossa paixão doutrinária é simplesmente um objetivo intelectual eticamente duvidoso, ou se somos completamente desproporcionais em nossos afetos para com outras doutrinas não tão consideráveis, então que o Senhor nos repreenda. Não devemos ficar surpresos se a teologia receber uma péssima classificação em tais circunstâncias. 

Mas quando se trata de pensar, alegrar-se e edificar uma igreja sobre fundamentos bíblicos saudáveis, deveríamos todos desejar uma igreja profundamente teológica. Eu poderia citar muitos motivos para pregar teologicamente e muitos motivos para pastorear uma congregação que ama teologia. Vou citar seis:

    1. Deus se nos revelou na sua palavra e nos deu o seu Espírito para que pudéssemos compreender a verdade. Obviamente, não precisamos dominar todos os temas das Escrituras para sermos cristãos. Deus é gracioso para salvar muitos de nós com falhas de discernimento. Mas se temos uma Bíblia, sem mencionar os empecilhos materiais quando se trata de recursos impressos, por que não gostaríamos de entender o máximo possível da auto-revelação de Deus? Teologia é saber mais de Deus. Você não gostaria que sua igreja conhecesse mais de Deus?

    2. O Novo Testamento dá muito valor ao discernimento entre a verdade e o erro. Há um depósito de verdade que deve ser resguardado. Falsos ensinamentos devem ser lançados fora. Os bons ensinamentos devem ser promovidos e defendidos. Isso não acontece com alguns candidatos a Ph.D. insensíveis que se consomem diante de microfichas. Foi a paixão dos Apóstolos e do próprio Senhor Jesus que elogiou a igreja em Éfeso por ser intolerante com os falsos mestres e que odiava o comportamento dos Nicolaitas.

    3. Os mandamentos morais do Novo Testamento são fundamentados em proposições teológicas. Tantas epístolas de Paulo têm uma estrutura dupla. Os capítulos iniciais apresentam doutrina e os capítulos posteriores nos exortam à obediência. Doutrina e vida estão sempre conectadas na Bíblia. É por causa das misericórdias de Deus, à vista de todas as realidades sólidas teológicas em Romanos 1-11, que somos convocados a entregar nossas vidas como sacrifícios vivos em Romanos 12. Conheça a doutrina, conheça a vida. Nenhuma doutrina, nenhuma vida.

    4. Categorias teológicas nos capacitam mais e nos fazem regozijar mais profundamente na glória de Deus. Verdades simples são maravilhosas. É bom cantar hinos simples como "Deus é bom. Sempre!" Se você cantar isso com fé sincera, o Senhor se agrada. Mas ele também se agrada quando podemos cantar e orar sobre exatamente como ele tem sido bom conosco no plano da salvação e no alcance da história da salvação. Ele se agrada quando nos gloriamos na obra completa de Cristo, quando descansamos em sua providência todo-abrangente, e nos maravilhamos na sua infinitude e auto-existência; quando podemos nos deleitar em sua santidade e meditar na sua Trindade e Unidade e nos maravilhar com sua onisciência e onipotência. Estas categorias teológicas não têm a intenção de nos encher a cabeça, mas nos dar corações maiores que adoram com mais profundidade e sermos mais altos porque pudemos ver melhor o que há em Deus.

    5. A teologia nos ajuda e nos ensina a nos regozijar mais profundamente nas bênçãos que são nossas em Cristo. Repito, é doce saber que Jesus nos salva dos nossos pecados. Não há notícia melhor do que essa no mundo. Mas como seu deleite será mais completo e mais profundo se você compreender que a salvação significa eleição pela graça de Deus, expiação para cobrir seus pecados, propiciação para desviar a ira divina, redenção para comprá-lo para Deus, justificação diante do trono do julgamento de Deus, adoção na família de Deus, santificação constante pelo Espírito, e glorificação prometida no fim dos tempos. Se Deus nos deu tantas e tão variadas bênçãos multiplicadas em Cristo, não lhe ajudaria a honrá-lo compreendendo quais são elas?

    6. Até mesmo (ou seria especialmente) os que não são cristãos precisam de boa teologia. Eles não se entusiasmam quando ouvem uma pregação ordo salutis seca. Mas quem deseja pregações secas seja sobre lá o que for? Se você pode falar de maneira simpática, apaixonada, e simplesmente sobre as bênçãos da vocação verdadeira, da regeneração e da adoção, e sobre como todas essas bênçãos que se encontram em Cristo, e sobre como a vida cristã é nada mais nem menos do que aquilo que somos em Cristo, e como isto significa que Deus realmente deseja que sejamos sinceros, quando nascidos de novo e não como éramos nascidos no pecado – se você der tudo isso aos que anão são cristãos, e o der explicitamente, você lhes dará uma porção de teologia. E, se o Espírito de Deus estiver operando, eles poderão simplesmente voltar para buscar mais.
Não existem motivos para qualquer igreja ser algo menos do que robustamente teológica. As igrejas continuarão sendo de todos os formatos e tamanhos. Mas "sem teologia", ou pior, "anti-teológicas" elas não deveriam ser.


Kevin DeYoung é o pastor da University Reformed Church em East Lasing, MI, EUA. Obteve sua graduação pelo Hope College e seu mestrado pelo Gordon-Conwell Theological Seminary. É autor de diversos livros, preletor em conferências teológicas e pastorais, é cooperador do ministério "The Gospel Coalition" e mantém um Blog na internet "DeYoung, restless and reformed". Kevin é casado com Trisha com quem tem 4 filhos.

Traduzido por: Yolanda Mirdsa Krievin

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

A RESPONSABILIDADE SOCIAL DO CRISTÃO EM GERAL (1º)


Que o homem é responsável por seu próximo é claramente ensinado na Escritura. O que aparentemente não é óbvio a alguns cristãos é que esta responsabilidade se estende às responsabilidades sociais bem como às espirituais. Um levantamento das Escrituras apoiará a posição de que o dever do cristão para amar inclui as dimensões sociais bem como espirituais do amor.

A. A Responsabilidade para com Outras Pessoas

É aparente em todas as partes da Escritura que os homens realmente têm uma responsabilidade diante dos outros. A resposta de Caim: "Acaso sou eu tutor de meu irmão?" é um "Sim" claro. Até mesmo antes de Caim, Adão recebeu a responsabilidade pela sua esposa, fato este que está subentendido no fato do mandamento destinado para Adão e Eva juntos, ter sido dirigido para Adão somente (Gn 2: 16, 17). Mais tarde, quando o assassinato e a violência encheram a terra, Deus deu aos homens a autoridade para administrar a pena capital, a fim de refrear a violência (Gn 9: 6). Esta responsabilidade dos homens uns pelos outros mediante o governo, é vista no decurso do restante do Antigo Testamento (cf. Dn 4:17), e também no Novo Testamento (cf. Rm 13:1-7).
A responsabilidade não é meramente proteger vidas inocentes; também inclui fazer o bem positivo em prol dos outros. Segundo Jesus, é o ensino do Antigo Testamento também que o homem é responsável por amar seu próximo como a si mesmo. Jesus disse que o amor é a essência da lei moral (Mt 22:39). Até mesmo disse que a totalidade da moralidade do Antigo Testamento podia ser reduzida à Regra Áurea (Mt 7:12). Exemplos específicos daquilo que significa amar aos outros não faltam nem na vida nem nos ensinos de Cristo. As curas que Jesus fez dos mancos, dos leprosos e dos cegos, ilustram Sua própria solicitude, e sua história acerca do Bom Samaritano demonstra o amor que todos os homens devem ter para com os outros (Lc 10:30ss).
As Epístolas do Novo Testamento abundam de exortações para os cristãos cuidarem uns dos outros e dos de fora. Paulo escreveu: "Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros" (Fp 2:4). Outra vez: "levai as cargas uns dos outros, e assim cumprireis a lei de Cristo" (Gl 6:2; cf. v. 10). A Primeira Epístola de João é muito explícita no que diz respeito à responsabilidade do cristão no sentido de amar aos outros, (cf. 3:17-18), como o é também a de Tiago (cf. 1:27). Em síntese, o homem é moralmente responsável pelos demais homens. Ele é o guardião do seu irmão.

B. A Responsabilidade para com a Pessoa Total

O que os cristãos às vezes não percebem, é o fato de que a responsabilidade de amar às outras pessoas se estende à totalidade da pessoa. Ou seja, o homem é mais do que uma alma destinada para outro mundo; é também um corpo que vive neste mundo. E como residente desta continuidade do tempo e do espaço o homem tem necessidades físicas e sociais que não podem ser isoladas das necessidades espirituais. Logo, a fim de amar ao homem conforme ele é — o homem total — é necessário ter uma solicitude acerca das suas necessidades sociais, bem como das suas necessidades espirituais.
Parte do descuido do "homem total" tem sua origem na ênfase platónica não-cristã sobre a dualidade do homem. Esta ênfase foi digerida pelos cristãos na Idade Média e tem sido transmitida para o presente.2 Em essência, argumenta que o homem é essencialmente um ser espiritual e que apenas tem conexão funcional com um corpo que, na melhor das hipóteses, é um impedimento, e na pior, um grande mal. A correção deste erro é achada no ensino bíblico acerca da unidade essencial do homem, e da qualidade boa da criação física e corpórea, feita por Deus (cf. Gn 1:31). Tanto a unidade do homem quanto a bondade do corpo ficam evidentes na doutrina cristã da ressurreição, fato este que é repugnante à mente grega (cf. At 17:32). A ressurreição do corpo não faria bom senso se os homens fossem completos sem seu corpo. Do outro lado, se o homem é essencial e permanentemente um corpo com alma, neste caso a negligência de qualquer aspecto é um erro sério. Se o homem deve ser amado como homem, deve-se amá-lo conforme ele é (e conforme ele será) viz., como criatura física e social, bem como espiritual.
Até mesmo se alguém rejeitar as doutrinas da unidade do homem e da imortalidade do corpo, é miopia demonstrar preocupação somente com as dimensões espirituais da vida. Os homens nesta vida, pois, têm mesmo corpos, e não podem viver aqui sem eles. Se, portanto, devemos alcançá-los para o mundo do porvir — se vamos salvar suas "almas" — então isto deve ser realizado através dos corpo deles. Os corpos que estão morrendo de fome dificilmente ficarão impressionados com a mensagem acerca do pão da vida, se nós lhes recusamos o alimento para esta vida. Jesus alimentou a multidão faminta com pão físico antes de pregar-lhe acerca do pão espiritual (Jo 6:11ss.). Os homens não têm muita probabilidade de sentirem sede pela água da vida enquanto estiverem assoberbados pela sede física. Noutras palavras, se os cristãos não mostrarem nenhuma solicitude para com as necessidades físicas e sociais básicas dos homens, neste caso não poderão esperar uma resposta multo positiva da parte deles para sua mensagem espiritual.

II. AS RESPONSABILIDADES SOCIAIS ESPECIFICAS DO CRISTÃO

Uma maneira de demonstrar que os cristãos realmente têm uma responsabilidade social, é mediante uma discussão das exortações específicas da Escritura quanto a isto. Há, muitas áreas de necessidades para as quais o cristão é responsabilizado com amor. A primeira área, e a mais básica, é a responsabilidade pelos seus.

A. A Responsabilidade Social Pelos Seus

A responsabilidade de uma pessoa prover para si mesmo e para sua própria família é sua responsabilidade social básica. Num tipo de sociedade socialista, é fácil esquecer que a sociedade não deve o sustento aos capacitados; pelo contrário, deve-lhe a oportunidade de ganhar a vida. É neste sentido que há verdade no lema: "Luto contra a pobreza; trabalho."3
1. Prover para Si Mesmo — Há um sentido em que o amor-próprio está na própria base da responsabilidade social.4 O homem deve amar a seu próximo como a si mesmo. Paulo disse: "Porque ninguém jamais odiou a sua própria carne, antes a alimenta e dela cuida...' (Ef 5:29). No entanto, nem todos amam a si mesmo de um modo apropriado. O modo apropriado de amar a si mesmo é prover as necessidades básicas para sua própria existência. Não será possível viver e amar aos outros a não ser que a pessoa ame sua própria vida e a sustente. "Contudo vos exortamos, irmãos," escreveu Paulo, "a diligenciardes por viver tranquilamente, cuidar do que é vosso, e trabalhar com as próprias mãos, como vos ordenamos; de modo que vos porteis com dignidade para com os de fora e de nada venhais a precisar" (1 Ts 4:11, 12). Na sua Segunda Epístola aos Tessalonicenses, o apóstolo lembra do seu próprio exemplo: "Nunca nos portamos desordenadamente entre vós, nem jamais comemos pão, de graça, à custa de outrem; pelo contrário, em labor e fadiga, de noite e de dia, trabalhamos, a fim de não sermos pesados a nenhum de vós" (3:7, 8). E deixou este mandamento com eles: "Se alguém não quer trabalhar, também não coma" (3:10).5
Destarte, uma das coisas mais importantes que cada homem capaz pode fazer em prol dos outros, é ganhar sua própria vida. Porque se cada homem que pudesse se tornasse independente, logo haveria menos homens dependentes dos outros para suas necessidades sociais básicas. Ou seja: o bem social fundamental que o homem pode fazer pelos outros é prover para si mesmo de modo que outros não precisem prover tanto para si mesmos quanto para aqueles que se recusam a se sustentar. Neste sentido, o amor-próprio é um dos bens sociais primários, e mais fundamentais que alguém pode realizar.
2. Provendo para Sua Família — Naturalmente, nem toda pessoa está capacitada a prover para si mesma. Há crianças, dependentes, viúvas, órfãos, e outras pessoas indigentes. Se acontecer que alguma destas pessoas está na família imediata dalguém, ou entre seus parentes, neste caso é sua responsabilidade social prover por elas. Quanto a este aspecto, a Bíblia é muito clara: "Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos de sua própria casa, tem negado a fé, e é pior do que o descrente" (1 Tm 5:8). Além disto: "Se alguma crente tem viúvas, socorra-as e não fique sobrecarregada a igreja, para que esta possa socorrer as que são verdadeiramente viúvas" (v. 16). A lição é que a obrigação social primária pelos pobres e necessitados não recai sobre a igreja nem sobre o estado, mas, sim, sobre a família imediata. Isto não significa, naturalmente, que a pessoa não possa cumprir sua responsabilidade social aos parentes, indiretamente, através da assistência social que é sustentada pelos seus impostos. Significa, isto sim, que o indivíduo capaz deve prover para seus parentes dalguma maneira, seja através do estado, seja por conta própria.
Do outro lado da questão, está subentendido que pessoas capazes, sejam elas viúvas ou não, proverão para si mesmas de modo que os parentes, a igreja ou o estado não tenha que prover para elas. Paulo não permitia que viúvas com menos de sessenta anos de idade fossem colocadas no rol da assistência, e mesmo então, somente aquelas que anteriormente tinham ajudado a outras eram arroladas (1 Tm 5:9, 10). As viúvas mais jovens eram encorajadas a manter-se ocupadas e a casar-se de novo (v.14). A regra subentendida a cada passo é que a pessoa deve prover para seus próprios, a não ser que seja incapaz de cuidar de si mesma. Se alguém deixar de prover para seus parentes indigentes, fracassou na sua responsabilidade cristã básica à sua própria família.
3. Provendo para Seus Irmãos Crentes — Segundo as Escrituras, a próxima responsabilidade social da pessoa é aos demais crentes. Além das da sua própria família, há as necessidades doutros crentes, que devem preocupar o cristão. Paulo conclamou os gálatas: "Por isso, enquanto tivermos oportunidade, façamos o bem a todos, mas principalmente aos da família da fé" (6:10). O próprio Paulo estava muito ativo em levantar uma oferta para os santos pobres em Jerusalém (cf. Rm 15:26). João, semelhantemente, ressaltou a providência para as necessidades dos irmãos, e escreveu: "Ora, aquele que possuir recursos deste mundo e vir seu irmão padecer necessidade e fechar-lhe o seu coração, como pode permanecer nele o amor de Deus?" (1 Jo 3:17).
Tiago é igualmente firme na ênfase sobre a providência para os irmãos: "Se um irmão ou irmã estiverem carecidos de roupa, e necessitados do alimento cotidiano, e qualquer dentre vós lhes disser: 'Ide em paz, aquecei-vos, e fartai-vos,' sem, contudo, lhe dardes o necessário para o corpo, qual é o proveito disso?" (Tg 2:15, 16). A fé sem obras é morta. Conforme a expressão de João: "Se alguém disser: 'Amo a Deus,' e odiar a seu irmão, é mentiroso; pois aquele que não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê" (1 João 4:20). E a marca mais básica do amor cristão é o amor aos irmãos. Jesus disse: "Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros" (Jo 13:35). A responsabilidade social do cristão, quanto ao amor além da sua própria família, começa com a família de Deus. Esta verdade também é subentendida no cuidado da igreja primitiva com suas próprias viúvas (At 6:1; 1 Tm 5:9ss).
Não se segue disto que os cristãos não devam se preocupar socialmente com os não-cristãos. Longe disto. A Bíblia está repleta de evidências de que os crentes devem fazer o bem a todos os homens. A solicitude social dos cristão deve começar com sua própria família e com outros crentes, mas não deve terminar ali.

Esse pequeno estudo (parte 1) está baseado no oitavo Mandamento da Lei de Deus.

Pr. José Francisco.