sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Perguntas básicas Acerca das boas obras
Enquanto Paulo enfatiza mais a fé, Tiago enfatiza mais as obras. Há algum atrito entre um e outro?
Creio que não. Vou tentar explicar as afirmações conflitantes de ambos. A justificação pela fé, isto é, pela confiança na graciosidade de Deus para com o pecador, não é invenção de Paulo. Apenas explicita o que Jesus ensinou e praticou e o que o próprio perseguidor de cristãos experimentou. Junto a Damasco, ele fora alcançado pela misericórdia imerecida à semelhança do malfeitor na cruz. A partir de então tornou-se arauto incansável desse presente inaudito. Já Tiago reage a uma situação diferente. Enquanto Paulo enfrenta a autojustificação humana, o irmão do Senhor depara-se com quem aceitou a salvação graciosa e a usa como desculpa para cruzar os braços e viver descomprometidamente. Obviamente, Tiago tem de classificar esta fé deturpada de “morta”. O próprio Paulo rejeitaria uma leitura pela metade do seu evangelho. Quem omitir o que diz o final de suas cartas sobre a obediência, jamais entenderá a fé que pregou. Na carta aos Romanos, Paulo usa duas vezes a expressão “a obediência que vem pela fé” (1.5; 16.26) para indicar o vínculo indissociável fé e obras.
Um dos atritos entre católicos e protestantes na época da Reforma era a questão da fé e obras. Quais eram as posições então assumidas pela igreja romana e pela igreja reformada?
Os atritos entre os líderes da Reforma do século 16 e a igreja romana podem ser sintetizados no debate de Erasmo e Lutero sobre o livre arbítrio. Erasmo afirmava que o homem coopera com a graça de Deus, querendo e buscando a sua salvação. Em sua resposta “Da vontade cativa” (Nascido Escravo, Ed. Fiel), Lutero insiste que, depois da queda, a humanidade está incapacitada para optar pelo bem, ainda que o queira. Assim, a obra salvadora é de Deus unicamente. Não há cooperação na salvação. A nossa parte não é fazer, segurar, mas deixar Deus fazer, carregar, qual a jaguatiricazinha.
Ainda existe diferença entre católicos e protestantes quanto à questão da fé e obras?
Há segmentos católicos com os quais se chegou a um consenso razoável na compreensão de fé e obras, à luz da Escritura. Mas, enquanto em Augsburgo luteranos e católicos assinavam solenemente um consenso desses, Roma publicava as indulgências referentes à virada do milênio. Assim, na prática, a dissensão básica continua.
Autor: Martin Weingaertner, pastor luterano, é capelão do Tribunal de Justiça do Paraná.