terça-feira, 30 de setembro de 2014

O Voto e a Igreja Cidadã

Pastoral à Igreja Cidadã

A igreja é a principal expressão da presença de Deus no mundo. Um povo santo, que celebra o Cristo ressurreto todas as vezes que congrega em comunidade, caminha pelas ruas da cidade, professa um ofício com dedicação e honra ou mesmo quando cuida da família com devoção. É povo formado por gente que deseja se parecer com Jesus.

1. A dupla cidadania
No Sermão do Monte, o Senhor Jesus apresenta o significado de uma vida vivida debaixo da dinâmica do governo de Deus sobre todas as coisas. As bem-aventuranças sinalizam um modelo de contracultura, onde o discípulo de Cristo é chamado ao protagonismo no reino dos homens, na medida em que se rende ao senhorio daquele cujo propósito na vida foi o serviço humilde, em cumprimento à vontade do Pai. 

1.1. Povo quebrantado (Mt 5.3-4)
Os cidadãos do reino de Deus são aqueles que primeiro reconhecem a insuficiência dos esforços humanos como caminho de salvação (Ef 2.8). Os que entram no reino dos céus são aqueles que sabem não serem merecedores desse reino; são desprovidos de qualquer justiça própria; são humildes/pobres de espírito e, por isso, choram, quebrantados, o choro do arrependimento e da contrição. (2Cr 7.14)

1.2. Povo humilde (Mt 5.5-6)
Povo manso/humilde é povo que entende o seu lugar no mundo, debaixo do senhorio de Cristo. Suas bandeiras serão sempre as da entrega sacrificial em amor. É povo comprometido com as causas da justiça restaurativa, desejoso por ver os valores do Reino sendo sinalizados sobre a terra (Mt 6.33).

1.3. Povo compassivo (Mt 5.7-9)
O povo de Deus, cheio da graça de Deus, é povo generoso. É gente que trata o seu próximo como criatura feita à imagem de Deus, e não como inimigo em potencial. É gente promotora de paz – não a paz “ausência de guerra”, mas a shalom, a paz que promove bem-estar completo e qualidade de vida para a coletividade. 

1.4. Povo perseguido (Mt 5.10-12)
Não há garantias de segurança para quem escolhe o caminho do discipulado. Assim como o evangelho atrai a tantos, a outros tantos ele repele. O caminho da cruz envolve arrependimento e renúncia da justiça própria; isso ofenderá muitos. A igreja cidadã compreende que o seu compromisso maior é com o eterno. Ela é esperançosa e perseverante; sua fé no Cristo ressurreto não admite o desespero.

2. Os desafios do nosso tempo 
2.1. O desafio de conhecer a realidade
O mundo que se apresenta diante de nós é marcado pela secularização, a pluralidade religiosa e o relativismo ético. A igreja do Senhor Jesus, comprometida com a missão de Deus, deve buscar conhecer a realidade em que está inserida. Deve ouvir o clamor do mundo e prestar atenção nas dores, bem como nas flores. O povo de Deus é peregrino, mas também é indígena, ou seja, da terra. Está de passagem, porém tem um compromisso com a realidade como ela se apresenta. O povo de Deus reconhece na pluralidade de manifestações culturais, científicas e religiosas, oportunidades potenciais para um serviço cristão que parta das reais necessidades de um mundo fraturado pela ação do mal.

2.2. O desafio de discernir a realidade
A igreja cidadã saberá ter objetividade em relação às necessidades reais do mundo em que vive. Lucidez é essa capacidade de avaliar com inteligência as conjunturas, nas suas dinâmicas de vida e de morte. Discernir a realidade é fazer uma aproximação crítica, atenta ao controle e à manipulação da grande mídia e de outros poderes, buscando sempre entender o porquê de as coisas serem como são. O Espírito Santo guiará a Igreja nesse entendimento.

2.3. O desafio de interceder pela realidade
O povo de Deus é chamado a interceder não somente pelas causas individuais. É preciso um posicionamento sério de oração pelas causas coletivas, pelas questões que envolvem a cidade, a nação e o mundo. Cremos em um Deus que pode transformar realidades. Por isso, é preciso compromisso intencional de intercessão pelo mundo, e estar atento às questões que envolvem as grandes estruturas para a vida em sociedade.
A igreja deve orar pela libertação de grupos oprimidos, pela saída dos homens maus dos lugares de poder, pela consolidação e garantia dos espaços democráticos de expressão. 

2.4. O desafio de intervir na realidade
Todo cristão precisa dar a sua contribuição de intervenção na realidade.
Essa contribuição responde à pergunta “O que me cabe fazer?”. A igreja brasileira constrói a sua identidade por afirmação e não somente por antagonismo.
Nós não somos salvos pelas obras, mas elas foram preparadas por Deus para que andássemos nelas (Ef 2.10). É dessa forma que a igreja intervirá propositivamente na realidade social. O Brasil é, notadamente, uma nação religiosa. Nem sempre o Estado anda em compasso com os anseios da Nação. A igreja se posiciona, no espírito de Cristo, através das causas que são legitimadas pelos valores do reino de Deus. O exercício de uma cidadania responsável é um conceito de santidade cristã.

Fonte: Cartilha Os Evangélicos e a Transformação Social, p. 28-32.  ULTIMATO - Setembro-outubro 2014

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